sábado, fevereiro 05, 2011

As dores de uma ressaca moral


Dor de cabeça, corpo dolorido, boca seca, mal-estar generalizado. Todas as características de uma ressaca clássica, por mais assustadoras que pareçam --e elas não assustam tanto assim, haja vista o fato de que nenhum bebum deixa de tomar seu porre por causa delas--, não são piores que os efeitos cruéis de uma ressaca moral.

Geralmente a ressaca moral, caracterizada pela dor psicológica de saber que você fez uma bobagem colossal, vem de mãos dadas com a ressaca do álcool.

É o caso, por exemplo, do sujeito que passa uma cantada na mulher do amigo, ou do cara que cai em cima do bolo em uma festa de casamento, ou ainda daquele camarada que resolve soltar seu lado Carlinhos de Jesus na festa da firma.

Mas a perversa ressaca moral não maltrata apenas quem bebe. Basta fazer uma boa lambança e até o mais abstêmio servo de Deus pode passar semanas sendo corroído pela lembrança do acontecido --que certamente, na visão do ressacado, poderia ter sido evitado.

Nosso amigo John Terry, zagueiro e capitão do Chelsea, sabe exatamente do que isso se trata. Ele teve a oportunidade de dar ao time londrino a maior glória de toda sua história.

Na decisão por pênaltis da Copa dos Campeões da Europa, diante do Manchester United, ele foi o responsável pela quinta cobrança de sua equipe. Os Red Devils haviam perdido uma com Cristiano Ronaldo. Era só Terry converter e comemorar. Mas o zagueirão escorregou e bateu para fora. Na seqüência, o Manchester acabou vencendo.

A ressaca moral do jogador foi tão grande que ele publicou uma carta aberta aos torcedores do Chelsea no site oficial do clube. O texto chega a ser emocionante. Dá para ter uma mínima idéia do sofrimento passado por ele.

Outros que com certeza acordaram "pensando na vida" nessa semana foram Zé Carlos e Edmundo.

Zé Carlos perdeu a última cobrança do Botafogo na disputa de pênaltis contra o Corinthians, pelas semifinais da Copa do Brasil. Ele dividiu seu sentimento de ressaca com o técnico Cuca, que, mais uma vez frustrado em seu perseguição pelo primeiro título na carreira, pediu demissão.

Edmundo, que perdeu pênalti no desempate do Vasco com o Sport, também pela Copa do Brasil, tomou a mesma atitude extrema em seu "day after". Pediu demissão e ainda por cima anunciou sua aposentadoria. Ainda que tenha sido apenas da boca para fora, dá para ver que deve ter sido uma bela de uma ressaca.

Porém, assim como a ressaca alcoólica, a ressaca moral não mata. A primeira geralmente incomoda por apenas um dia. A segunda pode até ser mais duradoura, mas, ainda assim, é curável até mesmo nos casos mais complexos.

Por isso mesmo, é interessante não tomar certas decisões em meio às dores da alma. Melhor que isso é esperar e tentar dar a volta por cima. Funciona em muitos casos. Talvez até para quem tentou se dar bem com a mulher do amigo, caiu em cima do bolo ou atacou de John Travolta em frente ao chefe.

EDUARDO VIEIRA DA COSTA
Editor de Esporte da Folha Online